segunda-feira, 28 de abril de 2014

Vestida de tinta


A cada página virada minha roupa muda de cor.
Quando ganho asas e aprendo a usá-las no próximo capítulo meus pés estão ao chão.
Na capa amarela sou bruxa na vermelha sou fada.
Riscam alguns traços da minha personalidade, traçam o meu destino e mudam o sentido da minha caminhada.
A cor dos meus olhos é modificada constantemente.
Cortaram o meu cabelo, me jogaram em terras distantes.
Lutei contra dragões, domei monstros e levei arranhões.
E quando aprendi a viver em terras longínquas me transportam para prédios pichados e buzinas para todos os lados.
E eu já não tenho mais fome, frio e nem medo.
Ela apontou o lápis e tentou riscar mais uma palavra em mim, fracassou.
Mudou a tinta, o papel e eu não me movi.
As páginas foram ficando em branco e outras manchadas de frases falhadas. E mesmo assim eu persisti em ficar imóvel no mesmo lugar. Não porque eu quis e sim porque senti meus pés estagnados, meus pensamentos evacuados.
Na tentativa desenfreada em escrever ela amassou a folha.
Fui arremessada para dentro de hastes de plástico.
Vi minhas várias vidas e histórias ignoradas, guardadas na estante.
Minha trajetória está lacrada nas prateleiras, afogadas na poeira.
Com o corpo amassado vejo, aqui debaixo, ela moldando um novo personagem. Dando tanto movimento até ele estagnar.

Sabrina Stolle